Criação de filhos não é ciência exata. Não há equação única que se aplique a todos os casos. Os pais que têm mais de um filho sabem, por experiência, que aquilo que funciona com um nem sempre se aplica ao outro. A tarefa é mais difícil e complexa do que parece. Cada filho parece exigir “tratamento sob medida”, cuidado e disciplina individualmente moldados e atender a essa necessidade exige algo parecido com a “sabedoria de Salomão”.
No caso de pais cristãos, além da preocupação com os aspectos normais da criação de seus filhos ainda há a necessidade de instruí-los e educá-los nos caminhos do Senhor e representar a paternidade de Deus para eles. Assim, como o Pai celestial age conosco graciosa e disciplinarmente, somos constrangidos pelos ensinamentos das Escrituras, a espelhar sua paternidade no tratamento com nossos filhos e isso requer obediência aos princípios da Palavra de Deus. Nesse sentido, um dos princípios a ser seriamente observado é aquele enfatizado pelo apóstolo Paulo em duas cartas diferentes, ou seja, “não provoqueis os vossos filhos à ira” ou “não irriteis os vossos filhos” (cf. Efésios 6.4 e Colossenses 3.21). De acordo com o apóstolo, quando os filhos são irritados por seus pais, eles se tornam “desanimados”, abatidos, desempenhando as suas atividades de maneira mecânica e sem alegria.
O problema é que os pais nem sempre percebem quando estão irritando seus filhos ou qual procedimento contribui para provocá-los à ira. Como acontece em outras situações, na educação dos filhos os pais também correm o risco de se tornarem “cegos para com os seus próprios erros” e assim causarem grandes males na vida daqueles que tanto amam. Pensando nisso, um conselheiro bíblico americano, Lou Priolo, como resultado de suas observações e experiência no aconselhamento familiar, desenvolveu uma lista de vinte e cinco maneiras que os pais acabam irritando os seus filhos (O coração da ira. São Paulo: Nutra Publicações,2009). Abaixo, eu apresento uma adaptação daqueles itens que podem auxiliar pais ou mães a refletirem sobre a maneira como estão criando seus filhos. Note o que pode gerar ira no seu filho ou filha:
- A falta de harmonia conjugal, quando o relacionamento do casal é marcado por contínuas intrigas, frieza e atritos.
- O estabelecimento de um ambiente familiar centralizado na criança, onde os filhos são a “razão de tudo” o que os pais fazem.
- Ocasiões nas quais os pais acabam se tornando exemplos de “ira pecaminosa” ou explosões de ira que não expressam a justiça de Deus.
- Disciplinar os filhos sempre com ira ou raiva.
- Disciplinar os filhos com xingamentos e ofensas à sua personalidade.
- Ser inconsistente na disciplina. Prometer disciplinar e não fazê-lo, disciplinar sem motivo algum ou por qualquer motivo trivial, etc.
- Cultivar padrão duplo na educação de filhos. Por que algumas coisas são válidas para um e não para o outro? Por que um pode levar uma surra e o outro apenas uma admoestação verbal?
- Ser um legalista, ou seja, não se lembrar da graça e da misericórdia, mas somente da lei que foi quebrada. Devemos sempre lembrar que nosso Pai celestial é gracioso conosco e nos concede perdão e restauração sempre que corremos para ele.
- Não admitir os seus próprios erros e nunca pedir perdão por suas falhas. Lembremos que a função paternal não nos isenta de falhas nem do dever de admiti-las para nossos filhos.
- Ser constante e contínuo em apontar as falhas dos filhos. De fato, esquecemos quanto é desanimador quando os pais parecem demonstrar que seus filhos estão sempre errados. O resultado é que eles podem sentir sempre como fracassados e nada do que fazem será suficientemente bom!
- A mudança dos papéis conjugais no lar, ou seja, a mulher se torna a cabeça e líder da família e o marido desempenha o papel de um mero auxiliador. Isso resulta na ausência da figura paterna e na inversão dos padrões estabelecidos pelo próprio Deus.
- O fato de nunca ouvir a opinião de seus filhos ou nunca atentar seriamente para os seus argumentos. A mensagem nessa situação é que eles nunca são importantes e nunca têm nada para contribuir.
- Comparar seus filhos negativamente em relação a outras crianças. Ao invés de isso provocar neles o desejo de melhorar, apenas os leva ao desânimo, pois entendem que nunca são suficientemente valorizados.
- Nunca ter tempo para conversas informais com eles. Isso pode ocorrer por causa do ativismo ou por não considerá-los suficientemente interessantes.
- Nunca encorajá-los nem apreciar suas qualidades. Para alguns pais, elogiar seus filhos é uma atividade tão difícil que nem lembram a última vez que o fizeram.
- Deixar de cumprir suas promessas. Tanto aquelas promessas negativas de disciplinas, como aquelas positivas de ajudá-los em alguma necessidade. O problema é que a esperança que se adia sempre adoece o coração (Pv 13.12).
- Discipliná-los diante de outras pessoas. Isso pode não apenas expor a falha dos filhos, mas envergonhá-los. O problema é que o resultado pode ser a revolta e não o arrependimento.
- Não conceder a eles liberdade suficiente e sempre “invadir sua privacidade”. A pressão nem sempre é interpretada como expressão de amor, mas de legalismo.
- Conceder liberdade excessiva aos seus filhos. O problema nesse sentido pode ser a mensagem de que o filho ou filha não é suficientemente importante para que os pais se importem com eles a ponto de cuidar do que estão fazendo.
- Zombar dos seus filhos. A zombaria destrói a confiança e não edifica nenhum relacionamento, especialmente aquele entre os pais e os filhos.
- Abuso físico. O que muitos pais pensam ser disciplina pode acabar se tornando abuso ou tortura física, mas a Bíblia adverte contra isso (Pv 19.18).
- A prática do favoritismo entre os filhos. Nesse caso, além de desmotivar os filhos, os pais acabam contribuindo para a inimizade entre irmãos.
- Expectativas irreais acerca do futuro dos filhos. O problema nesse caso é que nenhuma realização dos filhos será suficiente para os pais e isso acaba desanimando.
- A criação dos filhos de maneira mundana e com metodologias contrárias à Palavra de Deus. A confusão gerada nesse sentido contribui para o desfalecimento dos filhos que nunca sabem o que, de fato, esperar.
- A inconsistência dos pais na vida cristã. Essa hipocrisia acaba gerando desânimo em relação àquilo que deveria ser o mais valioso para os filhos: o progresso na caminhada com o Senhor.
Diferente do que alguns imaginam, esses princípios não são apenas para pais de crianças, mas inclusive de adolescentes ou filhos adultos. Por um lado, nunca é tarde para se arrepender de erros cometidos no processo da criação de filhos. Por outro lado, maternidade e paternidade são coisas que nunca acabam, por mais maduros que os filhos estejam. Acima de tudo, porém, não há fracassos nem falhas que o Redentor não possa redimir por sua graça.
Pr. Valdeci da Silva Santos
One Comment
Anatote Lopes
Grato. Este artigo é útil e urgente para muitas igrejas brasileiras.
Commenting has been turned off.